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  • O que é psicoterapia? Para quem serve? Por que fazer?

    Ao identificarmos que nossa vida não está no sentido que escolhemos - quando estamos perante as dificuldades que nos parecem insuportáveis e, nos percebemos perdidos. Quando nos deparamos com dores emocionais fortes, a psicoterapia surge como um local privilegiado para falar sobre essas questões. O que é psicoterapia? Para quem serve? Por que fazer? Há muitas pessoas que acreditam ou julgam que ao buscar uma psicóloga é assumir-se “insano”, então você, sendo “normal”, nunca se sentiu sobrecarregado, ansioso, triste, angustiado, confuso, perdido? Com problemas de relacionamento, insatisfação com a vida profissional, pessoal, familiar, dificuldade de adaptação e até mesmo sobre  perdas pode ser falado durante o processo psicoterápico. Um espaço de escuta, onde é possível falar sobre tudo aquilo que desgasta e as vezes impossibilita de levar uma vida mais leve. Como é o trabalho do psicólogo? Oferecer um espaço único de escuta. Uma caminhada que o paciente percorre e o psicólogo respeitará a história pessoal de cada um, assim como seus valores, seus desejos e sonhos. Durante o processo o papel do psicólogo é de facilitador, para que você possa olhar-se de frente e expressar-se, considerando que seus sintomas podem ser entendidos a partir dos laços afetivos de suas vivencias e de suas relações consigo mesmo e com o meio social. As pessoas questionam por que não falar sobre minhas frustrações para um amigo (a) ao invés de uma pessoa desconhecida? Pois bem, um familiar ou amigo é alguém que faz parte da sua história de vida, não está apto para te ouvir sem criar esperanças a seu respeito, sem julgar, sem relacionar a sua situação com a dela. Até mesmo naqueles assuntos mais difíceis de falar, o psicólogo se preparou para te escutar, auxiliar, intervir, estimular suas capacidades e a compreender o quanto você é único, e pode progredir ao desenvolver novos caminhos para lidar com suas emoções. Fazer psicoterapia é um investimento em si mesmo. E o custo da psicoterapia? Assim como o médico, o fisioterapeuta, o dentista, o nutricionista e muitos outros profissionais, o psicólogo é um profissional que estudou e continua estudando, dispõe de um local acolhedor, seguro e faz uso de instrumentos e ferramentas algumas vezes não mensuráveis, mas que fazem os seus serviços terem valor. Tal valor pode ser comparado ao custo de uma ida ao salão de beleza, ao custo de um jantar ou balada/bar com amigos, etc. Porém, pode representar pouco diante daquilo que você pode alcançar. De forma breve, a maioria de nossas frustrações ocorrem porque não percebemos como atua a mente que nos habita ou não compreendemos porque funcionamos de certa maneira. Por fim, a condição para buscar psicoterapia é perceber que algo lhe angustia. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453 Assuntos relacionados: Psicólogo não tem Bola de Cristal – 8 Mitos sobre a Profissão

  • Suicídio: Vivência de uma Dor Emocional Intolerável

    Muitas vezes julgados (as) por um discurso “pesado”, acabam por manter em silêncio o sofrimento. A palavra é uma forma de simbolizar (de se manifestar) para que a pessoa não parta para o ato. Quando a pessoa parte para o ato, seja uma agressão ou até mesmo o suicídio, pode ser porque, de alguma forma, não foi possível dar um outro trajeto para esses sentimentos. Independente do ponto de vista pelo qual é analisado o suicídio, a vivência é de uma dor emocional intolerável. A pessoa que realizou o ato de se suicidar abandona muitas outras coisas – amigos e familiares – que consequentemente a vida será profundamente atravessada desde o ponto de vista social, emocional e econômico. Alguns fatores de risco para o suicídio pode ser certas situações clínicas como doenças crônicas da qual a pessoa fica inabilitada, desfigurada ou dolorosas intervenções. Personalidade que possui forte traço de agressividade e impulsividade, perdas recentes, perdas de membros parentais na infância, fácil acesso a meios letais, conturbações na dinâmica familiar, etc. Pessoas que já tentaram suicídio pode ser um grupo considerado de maior risco para cometer o ato novamente. Os valores sociais podem interferir como fatores de proteção ou de risco. Por exemplo, sociedades que legitimam a reciprocidade, propõe incentivos para conversas e são abertas a mudanças e trocas de opinião, talvez possam proporcionar aspectos mais protetivos frente a possibilidade de ocorrer suicídio. Já em sociedades nas quais pedir auxilio é visto como um sinal de fragilidade acontece o oposto. Aliás, suicídio é a vivência de uma dor emocional intolerável. Vai muito além de frases motivacionais ou comparações: – “Precisa se animar um pouco, relaxa, todo mundo tem problema!” – “Ah! Para com isso é frescura, falta de procurar algo para fazer!” – “Eu acho que isso é falta de Deus na sua vida” A prevenção do suicídio ocorre por meio da diminuição dos fatores de risco e reforço dos fatores ditos protetores, como por exemplo, sentir-se integrado a uma comunidade ou grupo; fazer análise ou psicoterapia pode auxiliar nas questões emocionais; bons vínculos afetuosos; estar casado ou com companheiro (a) fixo; religiosidade; ter filhos pequenos etc. O sentimento de “pertencer”, através do sentir-se fortemente ligado a um grupo étnico ou religioso, a uma família ou algumas instituições, em uma comunidade que pode proteger a pessoa do suicídio, nesse sentido, compreende-se que há poucas manifestações do suicídio com sentimentos de desesperança e solidão. E então? Quando a pessoa fala “quero morrer” está falando do que? Acabar com a angustia? Desfazer daquilo que dói? Em psicanálise (análise) ou psicoterapia, por exemplo, o psicólogo oferece uma escuta totalmente individual, no um a um, é sobre transformar essa angústia em palavra, procurar por um espaço de escuta aponta cansaço junto a coragem de não querer ficar na mesma, é sobre trabalhar muito em análise. Aponto para a cautela quando por via dos medicamentos tiramos a possibilidade de que a pessoa fale sobre isso. Considerar os aspectos que reduz o suicídio é, reconhecer que há possiblidade para oferecer a essas pessoas outras maneiras de enfrentamento, é oferecer outras alternativas e mostrar que esse ato fatal não é a única solução para o sofrimento. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

  • Câncer de Mama: Benefícios de Fazer Psicoterapia Durante o Tratamento de Quimioterapia

    Apesar do progresso da medicina, aumento da comunicação e divulgação pela mídia no tratamento do câncer de mama, ainda assim, é possível observar uma carga de sentimentos relacionado ao câncer como “sentença de morte”. O diagnóstico de câncer de mama e todo o processo da doença são vivenciados pela pessoa e pela sua família como uma fase de profunda angustia. O tratamento de longa duração, acarreta prejuízos nas habilidades funcionais, sintomas adversos, rótulo de uma doença dolorosa e mortal, muitas ideias e preocupações em relação a morte, mutilações (retirar mama) e dor estão presentes. Ao descobrir o diagnóstico de câncer de mama, pode ocasionar abalos significativos na feminilidade já que o seio é um órgão carregado de simbolismo para a mulher, e talvez angustias vinculada a maternidade. As implicações emocionais do diagnóstico e tratamento provocam alterações significativas nas diferentes esferas da vida: trabalho, lazer e família causando momentos aflitivos em seu dia-a-dia e nas relações interpessoais. O fato de saber que tem uma enfermidade sem causa definida traz muita culpa e angustia, sendo que enxergar o futuro passa a ser muito doloroso. Os tratamentos oferecidos causam mutilações, vômitos, alterações sexuais e reprodutivas, como a menopausa precoce. As mulheres com câncer de mama e pessoas com doenças crônicas abordam algumas preocupações constantes, tais como: mudanças na autoimagem, raiva, medo da dependência, isolamento, medo do abandono e da morte. Outras preocupações constantes são: depressão e ansiedade que estão entre as complicações psicológicas frequente. Mesmo após o término do tratamento essas comorbidades podem continuar por conta do medo da doença voltar. A mulher mastectomizada vivencia mudanças significativas na sua imagem corporal, as consequências psicológicas causadas pelo câncer de mama apontam que quanto maior a mutilação, mais traumático será o afeito. Apesar dos bons resultados, muitas pacientes possuem o medo do retorno da doença e dificuldade em lidar com as sequelas deixadas pelo tratamento, esses fatores influenciam no sucesso do tratamento e da reabilitação, impactando na qualidade de vida emocional dessa mulher. A atuação da psicóloga tanto no consultório quanto no ambiente hospitalar é fundamental ao longo do tratamento, já que sua pratica é direcionada ao bem-estar emocional, colaborando para uma boa qualidade de vida para a paciente. Benefícios de fazer psicoterapia durante o tratamento de quimioterapia: O ponto de partida da atuação da psicóloga no tratamento de câncer de mama é manter o bem-estar psíquico e identificar os fatores emocionais que afetam a saúde da mulher durante o tratamento. O trabalho da psicóloga também inclui reduzir e prevenir os sintomas físicos e emocionais causados pelo câncer durante o procedimento. O desconhecimento sobre como será a evolução da doença, e que nada pode ser feito para evitar um câncer surge o sentimento de impotência. A psicóloga como facilitadora pode proporcionar um espaço de escuta e sempre trabalhando com a realidade. As mulheres bem informadas costumam reagir melhor ao tratamento, quanto mais informação sobre sua doença, maior será sua capacidade de enfrentamento. As preocupações que mais aparecem são: sentimento de fracasso e impotência, temor da morte, da solidão e dos efeitos adversos do tratamento oncológico. Saber controlar a dor, náusea, pânico e vômitos, pode trazer a sensação de administrar melhor a doença. A pessoa percebe que é capaz de fazer algo em seu próprio benefício. Os grupos psicoterápicos têm algumas características que contribuem para sua eficácia: muitas mulheres tendem a se sentir rejeitadas e acabam se isolando, o grupo pode auxiliar nessa reaproximação - dando voz aos sentimentos escondidos. O trabalho em grupo é uma forma de criar relações sociais e sentirem aceitas. As intervenções psicológicas trazem consequências positivas tanto no aspecto emocional (depressão e ansiedade) quanto nos sintomas físicos (náuseas, fadiga e vômitos), para que a mulher não abandone o tratamento é importante a participação mais ativa nesse processo. A longevidade das mulheres com câncer de mama está relacionada a capacidade de se ajustar a doença, o trabalho psicoterápico influencia na sobrevida, por exemplo: bom suporte social e afetivo, expressão dos sentimentos, ser ativa em relação ao tratamento e principalmente dar voz a subjetividade de cada uma. Do contrário, a paciente não estando bem emocionalmente, estará mais vulnerável. Mulheres que enfrentam o câncer de mama e que além dos tratamentos médicos habituais, se submetem a intervenções psicológicas (psicoterapia individual ou em grupo), por exemplo, possuem um diferencial qualitativo. Mulheres em tratamento psicológico vivem mais do que as expectativas médicas. A prevenção do câncer de mama é fundamental para evitar transtornos maiores. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

  • Depressão ou Tristeza? Psicoterapia ou Remédio?

    Esse artigo traz um pouco sobre o sentimento de tristeza que as vezes é confundido com a depressão. Procurar análise ou psicoterapia e/ou até fazer uso de remédios são dúvidas que passam quando nos sentimos muito triste. O psicólogo não é juíz, perito, conselheiro, superior, muito menos está ali para julgar. Está como alguém que durante esse processo, escuta como é para a pessoa vivenciar aquele momento de tristeza. Lembrando que no processo psicoterápico cada um traz consigo suas experiências, conhecimentos e seus conceitos de forma única e pessoal. A depressão não se resume a lamentações, perdas, sentir-se triste ou vazio, mas também significa um lugar de transformações, cheio de riquezas, uma nova fase que pode haver colheita de potencial de vida. A depressão pode ser um estímulo para encontrar novos caminhos, entrar em contato com o caminho interior. Muitas pessoas negam a dar esse passo a frente e acabam ficando presos ao passado, procurando dar continuidade a partir da primeira metade da vida. A depressão também pode ser uma chance de vida, pois induz a reconquista do tempo e reflexão sobre o objetivo de vida. Todos nós em algum momento teremos pouco sucesso ou nenhum em alguma coisa da vida e, isso nos deixará cabisbaixo, o que é esperado. Afinal é depressão ou Tristeza? Atualmente é possível observar que tanto os médicos quanto os pacientes confundem tristeza com depressão. Não se pode mais ficar entediado, triste, chateado porque é imediatamente visto como depressão. É mudar um sentimento normal, que todos devemos ter, claro que, deve ser investigado as condições patológicas da pessoa. As pessoas não se permitem sentir coisas humanas, como o sentimento de tristeza. Sentem envergonhadas de estarem tristes, por exemplo, é comum ver a maioria das pessoas usarem óculos escuro durante o velório, esconde-se sutilmente as lágrimas porque talvez não seja agradável demonstrar que está triste, mesmo em situações óbvias evita-se demonstrar a tristeza. Depressão ou tristeza, psicoterapia ou remédio? sobre a conduta médica, sem generalizar, é a medicalização de uma situação humana, a tristeza. Quando existe a necessidade de utilizar remédios não há problemas ao encaminhar o paciente para um trabalho com o médico paralelamente com a análise ou psicoterapia. Algumas pessoas afirmam: Não preciso ir ao analista ou psicólogo, porque já estou tomando remédio prescrito pelo psiquiatra. A questão não é o medicamento em si, a questão é mais ampla, é acreditar que por ocorrer uma melhora dos sintomas, os seus problemas estão resolvidos. Muitas pessoas começam a se tratar com psiquiatras antes de buscar análise/psicoterapia. Claro que se o medicamento prescrito reagir bem e se adequar a seu corpo, após alguns dias, pode haver uma melhora significativa dos sintomas. Porém, existe grande chance dos sintomas retornarem assim que o medicamento for retirado, é essencial que a causa dos sintomas sejam trabalhados e investigados. Os medicamentos agem nos sintomas e não na causa, como assim? No incêndio o “fogo” são os sintomas, isto é, o que se vê e sente, mas existe algo anterior a isso, ou seja, o que causou esse incêndio? Um outro exemplo, se a pessoa está resfriada poderá utilizar medicamentos para minimizar os sintomas ou cessá-los de vez correto? Mas, algo provocou aquele resfriado. Não se fica resfriado “do nada”. Se o que provocou aquele resfriado foi a pessoa ter se molhado na chuva por algumas horas em um dia frio, e continuar tomando banho de chuva no frio e permanecendo molhado por horas, as chances de ficar resfriado novamente é grande. A causa vem antes dos sintomas. Nada acontece do nada. Sendo assim, mesmo que esteja tomando medicamento e quer agir na raiz, na causa do conflito, deve sim procurar um psicanalista ou psicólogo. O desamparo é um estado humano, é o que ocorre nos dias atuais, é necessário encarar esse desamparo, assim como a solidão, o fracasso e o isolamento. O encontro com a felicidade não se resume apenas em coisas positivas, é também aceitar o sofrimento, as limitações, os fracassos e as incompetências. Resumindo, é normal ficar triste de vez em quando. Em análise/psicoterapia propõe-se um espaço de escuta, poder colocar em palavras aquilo que traz angústia, é dar voz aquilo que grita dentro do sujeito. É poder se escutar e talvez entender onde dói, como dói e o que é possível fazer com isso. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

  • Psicólogo é para Louco? 8 Curiosidades Sobre o Profissional da Psicologia

    Este artigo é baseado em curiosidades e dúvidas de amigos (as), familiares, pacientes e curiosos ao longo do tempo de minha formação e atuação como psicóloga. Separei 8 curiosidades sobre o profissional da psicologia, pois para uma boa parte da população a psicologia ainda é uma das profissões que gera muitas dúvidas de como o psicólogo trabalha. As vezes criamos um conceito sobre algo que não necessariamente se trata da realidade, de modo geral, nos baseamos no senso comum sobrecarregado de pré-conceitos acumulados ao longo do tempo de nossas vivências. É importante ampliar o conhecimento sobre a psicologia e o psicólogo de modo a desmistificar equívocos sobre a profissão que as vezes surge por falta de informação. 1. Posso fazer faculdade de psicologia por hobby ou para meu autoconhecimento? Algumas pessoas já me falaram que gostariam de fazer o curso de psicologia para adquirir autoconhecimento. Pelo simples fato de ter um hobby de gostar de observar as pessoas, gostar de ouvir, muitas vezes se sentem o psicólogo do amigo (a) ou da família e, ao fazer o curso poderia adquirir manejos de "prever" comportamento humano. Houve pessoas que me falaram que se fizerem o curso de psicologia estará se conhecendo melhor, vai driblar melhor os problemas e os traumas, lamento decepcionar, mas é um grande equivoco. Quando queremos buscar o “autoconhecimento”, buscar algumas respostas de como funcionamos no meio social, pessoal e profissional, neste caso fazer psicoterapia seria o mais adequado e não fazer uma faculdade de psicologia. O que é psicoterapia? Ao identificarmos que nossa vida não está no sentido que escolhemos – quando estamos frente as dificuldades que nos parecem insuportáveis, nos percebemos perdidos, nos deparamos com dores emocionais fortes, a psicoterapia surge como um local privilegiado para falar sobre essas questões. 2. Psicólogo é para louco? Essa pergunta é um clássico no consultório, muitos trazem esse questionamento quando buscam um psicólogo, psicanalista ou psiquiatra – “Será que fiquei louca (o)?” Muitas pessoas que acreditam ou julgam que ao buscar psicólogo é assumir-se “insano”, então você, sendo “normal”, nunca se sentiu confuso, sobrecarregado, angustiado, triste, perdido? Com questões no relacionamento, insatisfação com a vida profissional, pessoal, familiar, dificuldade de aprendizagem, adaptação e até mesmo perdas podem ser abordados na psicoterapia. Psicólogo precisa ser visto como profissional da saúde mental e não somente da doença mental. É preciso ter cautela com a forma como tratamos o que não sabemos ao certo e desconstruir o que se compreende por “loucura”. Aliás, não fica louco quem quer. A psicologia surgiu em seu contexto clínico, diante de demandas específicas focadas na doença mental e desajuste social, com o tempo essa percepção foi mudando de uma ideia de cura para uma ideia também de prevenção, manutenção e promoção de saúde. Atualmente as pessoas procuram psicólogos não porque estão doentes, mas porque querem se desenvolver enquanto pessoa, aprender lidar com suas próprias dificuldades e questões, que sem exceção, todos temos. 3. O Psicólogo não adivinha nada, nem “tem bola de cristal” Muito menos bruxo da sociedade contemporânea. Ao longo do meu percurso estive diante de pessoas que levantaram a questão que o psicólogo tem “bola de cristal”, assim, é possível obter “vidência” dos sentimentos e pensamentos dos pacientes. A principal ferramenta do psicólogo é a escuta. Temos uma bagagem para descobrir o que está “invisível” e, a partir disso a pessoa, grupo ou instituição possui um papel fundamental. Para que se desenvolva o trabalho, é necessário que as pessoas contem sua história, falem de si, exponham suas reflexões, dialoguem. Nada está pronto! A partir da escuta e de nossa bagagem teórico-prática, construímos caminhos junto ao sujeito. De certa forma, poderíamos dizer que as pessoas sabem muito sobre si mesmas; no entanto, o psi dispõe de instrumentos adequados para auxiliar a organizar, entender e colocar em pratica esse saber, consequentemente pode permitir transformação de sua ação perante o meio em que está inserido. 4. Por que procurar um psicólogo se eu tenho amigos? Eis a questão! Claro que o apoio de qualquer pessoa pode auxiliar a superar uma dificuldade – assim como dançar, fazer ginástica, ouvir música, tomar uma cervejinha no bar com as amigas (os). Um amigo lhe proporcionará um apoio no sentido de dizer o que faria em seu lugar e irá te aconselhar. Já a intervenção da psicóloga é planejada e intencional com o intuito de direcionar naquele aspecto percebido como crucial. O psicólogo faz uso de ferramentas e estratégias para auxiliar o paciente a decidir seu próprio caminho. Não devemos e nem podemos tomar decisões pelo paciente. O caminho é seu e você quem deve percorrê-lo. 5. O psicólogo analisa todo mundo o tempo todo? Essa questão aparece em diversos lugares quando tem um psicólogo na família, entre amigos, ou até mesmo entre desconhecidos. Qual psicólogo que não ouviu essas frases ou suas variações: – “Está me analisando?” – “A minha amiga isso, meu namorado aquilo… O que você pensa a respeito?” – “Sobre toda essa história que lhe contei, você acha que eu tenho algum problema? O que eu tenho de fazer?” – “Você que é psicóloga deve saber, pode me dar alguns conselhos!” Acho compreensível as pessoas falarem isso, mas é um grande equívoco. Alguns propagam estereótipos sobre os psicólogos: aqueles que querem ajudar, serenos, bondosos, etc. Acredito que não esteja claro para as pessoas que dentro do consultório estamos exercendo uma função muito específica, e que em nosso dia a dia não é assim que acontece. Não trabalhamos fora do trabalho, isso está completamente fora da ética profissional. No tempo livre conversando com alguma colega a escuta é muito diferente daquela que exerço no trabalho. Eu quero poder rir das piadas, fofocar, sonhar junto, trocar experiências. Eu quero poder dizer que sinto muito, que fico feliz por ela, quero alimentar meu ego e ao final da conversa ir embora sem ter que receber algo ou pagar ($). Sem dúvida que mesmo em nossa vida pessoal trazemos um total de bagagem e, ainda assim, não aplicamos técnicas no cotidiano, com nossos familiares ou amigos e muito menos, os analisamos. Pode-se dizer que algum psicólogo que faça isso, estaria precisando de ajuda. E como ficariam as minhas relações? O quanto seria insuportável analisar tudo o tempo todo? Onde estaria a filha, mãe, amiga, colega? Como seria casar e ao invés de esposa fosse analista do marido? 6. Psicólogo tem uma “receita mágica” para resolver os problemas Alguns pacientes chegam com tais questões: - "Busquei ajuda porque me sinto ansioso demais, estou aqui para você falar o que eu devo fazer." - "Ah! Você é psicóloga me ajuda a resolver isso!”. E não é bem desse jeito que funcionam as coisas. Não resolvemos os problemas em alguns segundos, é necessário um tempo para que isso ocorra. O psicólogo trabalha com a escuta, com a singularidade do sujeito, ou seja, não temos manual ou uma receita pronta de como resolver os problemas alheio, cada pessoa é único em sua história. Muitas vezes a pessoa não consegue enxergar sozinha, mas quem possui a solução dos conflitos é ela mesma. Portanto, não existe mágica, auxiliamos nesse processo e todo processo leva tempo. 7. Psicólogo “tira de letra” os problemas e as dificuldades e não precisa fazer psicoterapia ou análise Se fosse assim, não existiriam nutricionistas acima do peso e os médicos não ficariam doentes. A maioria das pessoas acham que os psicólogos lidam bem com as próprias emoções. Acho essa analogia sensacional! É quase como dizer que um dentista lida bem com as próprias caries. No curso de psicologia aprendemos que também precisamos de análise ou psicoterapia, conhecer nossos “monstros” internos para poder lidar com os das pessoas. Vivemos no mesmo mundo e passamos pelas mesmas dificuldades que qualquer pessoa. Não somos semideuses, antes de sermos psicólogos, somos seres humanos e isso nos aproxima. Pelo menos algumas de suas batalhas e dores, se assemelham às minhas. 8. O psicólogo que não é casado, não tem filhos, ou é muito jovem não vai compreender o que estou enfrentando por não ter passado por essas experiências Importante ressaltar que esse tipo de pensamento é muito comum em relação aos profissionais que se formam muito cedo e, não é bem assim. Este profissional adquiriu experiência a partir de sua formação, realidades sociais, anos de estudos sobre o ser humano, estágios supervisionados, do qual permite que haja conhecimento sobre as diversas realidades e situações vivenciadas pelas pessoas. “Se o psicólogo não teve depressão, não vai saber na prática o que eu tenho. Só quem passou sabe como é.” - Um médico não precisa ter câncer para saber lidar e tratar do câncer, Certo? Com o psicólogo funciona da mesma forma. A caminhada acadêmica, estágios, supervisão, atendimentos, diversas matérias, visitas a diversas instituições possibilitaram outro tipo de conhecimento, que não precisa vir apenas da vivencia em si. Aliás, o tripé (análise/psicoterapia, supervisão, estudos) devem continuar após a graduação. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

  • Eu, Mamãe e os Meninos: Um Caso Sobre Identidade de Gênero

    Muitas vezes é difícil para um menino ou menina saber sua identidade de gênero. E a família sempre tem um papel decisivo para que essa dificuldade se instale. Eu, Mamãe e os Meninos é u ma história de vida curiosa: filho caçula de uma mãe que deseja ter uma filha, desde cedo Guillaume ligou-se a esse desejo e tudo que ele fazia era para agradá-la. Embora possua gestos afeminados: a fala, o andar, gesticula como sua mãe ao passo que repudia os esportes viris que tanto atraem seu pai e irmãos. O filme não deixa claro se Guillaume considerava-se menino ou menina, evidenciando assim o seu conflito. Também não é explicito o porque desse desejo da mãe que ele fosse menina. Guillaume escreveu um monólogo para o teatro e depois resolveu dirigir seu primeiro longa, onde essas lembranças são encenadas com genialidade e muita fineza. “Eu, Mamãe e os Meninos” (Les Garçon et Guillaume à Table) é um filme autobiográfico (o que deixa mais interessante) dirigido e interpretado por Guillaume Gallienne, com os detalhes de um caso confuso e difícil sobre a definição da identidade de gênero. O que é identidade de gênero? Esse conceito significa sobre o relacionamento da pessoa com o seu próprio corpo. Por exemplo, existem pessoas que nascem biologicamente homens, mas não se identificam com esse gênero desde a infância, o que pode gerar confusões internas. Na hora de chamar os filhos para o almoço, a mãe diz: – “Meninos e Guillaume, almoçar!” (traz a ambiguidade) com isso nega a ele a masculinidade colocando-o como diferente de seus irmãos homens, portanto deveria ser uma menina. Ela, mãe de três filhos, desejava ter uma filha. Fica nítido tanto pelo título do filme quanto pelo diálogo inicial entre mãe e filho. Guillaume conta para sua mãe sobre seu amor por Ana, quando ela responde: - “como vai ele?” Não precisamos dizer o quanto esses lapsos representa o desejo inconsciente dessa mãe. Guillaume fica confuso e deixa para lá, em seguida começa elogiar sua mãe do quanto ela fica linda falando espanhol. O filme gira em torno de uma grande dificuldade frente ao desejo dessa mãe. A intenção aqui não é realizar um diagnóstico de Guillaume, mas nos leva a pensar na estrutura neurótica, já que ele demanda o tempo todo ao Outro varias questões como: “Quem sou eu?”, “Como tenho que ser?”, “O que quer de mim?”. Um exemplo, na cena da viajem a Espanha, uma moça se recusou a dançar Servilhana (dança típica) seria para dançar com homens e não entre duas mulheres. Guillaume pergunta a ela se ele parece com uma mulher ao que ela responde positivamente. Isso fez ele vibrar por achar que sua mãe ficaria feliz em saber. A mãe é uma pessoa com aparência segura, agressiva e arrogante, por mais que tenha amor pelo filho mantém um vínculo de domínio frequentemente sádico. A necessidade de ser reconhecida como perfeita, sem limites, ela reage de forma agressiva a algum tipo de crítica que possa desmontar sua armadura onipotente. Com certa fixação Guillaume imitava a voz, o andar e a forma como sua mãe mexe o cabelo. A idealizava quando mencionava que ela não tinha nenhum defeito dizendo: “Minha mãe é maravilhosa”, “Ela é sempre linda!”. Essa fixação ao objeto materno corresponderá ao entrave que ele vai se deparar no momento de se relacionar com as mulheres. Ele não entendia porque a mãe estava infeliz, sendo que ele é uma menina como ela, sobretudo, como ela desejava. Continuava confuso, então, resolveu que não precisava se limitar as mulheres de sua família e expandiu seu olhar para cada detalhe de diversas mulheres ao seu redor. Passou a admirá-las – uma a uma – quando se dá conta que (A Mulher) não existe, Guillaume começa a deixar essa posição de objeto de sua mãe, e passa a gostar das mulheres. Nesse sentido, para tornar-se homem é necessário o menino distanciar-se de sua mãe em maior ou menor grau para se aproximar de uma mulher. Guillaume dizia que a mãe comprava roupa de menino para ele para não irritar o pai porque o mesmo não queria que ele fosse uma menina. Na verdade esse pai não queria o filho alienado ao desejo da mãe. Durante o teste de Rocharch ele vê na prancha dois ratos comendo um ao outro, a terapeuta fala que a maioria vê borboleta. Guillaume pede para trocar e colocar borboleta. Apresentou dificuldade de discutir algo através de seu próprio olhar, receio de desagradar. Evita demonstrar sua voracidade e agressividade frente aos conflitos internos sobre sua sexualidade. O sentimento de insatisfação traz a necessidade de agradar para se reassegurar e se confirmar através do desejo do outro. O filme segue com inúmeras tentativas frustradas do protagonista de responder desse lugar em que é colocado. Sua tia sugere que ele deveria experimentar relacionar-se com homens a fim de responder sua questão sobre ser homem ou mulher, já que ele – adulto – nunca tinha se relacionado com ninguém. O sujeito se identifica e opera através da própria construção daquilo que entende frente aos conflitos dos desejos inconsciente dos pais, e do papel em que é imposto de forma implícita pela família. Na cena em que a mãe reage de forma distante tentando ignorar o choro do filho, em seguida tenta conversar. Guillaume desabafa e conta que ama Jeremy mas ele gosta de Liza, então, pergunta para sua mãe o que ele deve fazer. Ela responde de forma seca que muitos deles são felizes: - “meninos que gostam de meninos... homossexuais”. Fica nítida tamanha alienação ao desejo materno, quando em sua pergunta sobre o que o Outro materno quer dele, depara-se com a irritação de sua mãe. Claramente podemos observar durante o longa que a identidade sexual e a identidade de gênero ocorrem através das representações psíquicas que são transmitidas. Acontece primeiramente pelo discurso dos pais e pelo inconsciente biparental, mais para frente, pelo discurso sociocultural do casal parental. E assim, pela primeira vez a mãe o nomeia como menino. Por uma questão lógica, com a resposta da mãe ele entendeu que não era uma garota. Guillaume seguiu com a ideia de que para ser homossexual era preciso inicialmente ser homem, e por ser um rapaz era difícil ser viril e enfrentar o medo que tinha de cavalos e servir ao exército. Dessa forma, o desejo da mãe de ter uma filha, por fim, estimula que seu filho caçula fosse visto como homossexual também por todos – colegas da escola, terapeutas e irmãos. Guillaume tinha necessidade de ser perfeito e aparentava nunca se sentir autossuficiente. O analista fala que ele não gosta de si mesmo. O protagonista se lembra de sua mãe que o chama de narcisista por só pensar nele e que ele não tem autoconfiança. Isso fez com que ele olhasse para si mesmo e não mais para a mãe maravilhosa ou para o que os outros pensavam dele. O acesso as representações simbólicas do masculino e ao modo como o sujeito vivenciará sua masculinidade, será importante a relação com um pai real, ou substituto. Guillaume ao fazer aulas de equitação para dominar seu medo de cavalo (simbolizava: medo de aceitar sua virilidade e desagradar o desejo da mãe de ele não ser uma menina), um instrutor calmo e gentil o ajuda perder esse medo e confiar no animal. Na cena que Guillaume telefona a uma amiga para ir a casa dela. A mesma informa que receberá apenas suas amigas para um jantar. Esta resposta já o coloca no grupo dos homens. Ele decide ir ao jantar e naquela noite, ele avistou a mulher mais bonita do mundo, adorável, atraente e bela. Surpreendentemente, na mesma noite em que sua amiga inverte a frase de sua mãe e chama: - “Meninas e Guillaume, jantar!”. Ele adora a ideia e jamais pensou ouvir isso antes. Guillaume através das artes cênicas reelabora seus traumas, recria seus objetos destruídos e repensa sobre suas feridas narcísicas. Ao contar para sua mãe que vai escrever uma peça sobre um garoto que aprendeu a aceitar sua heterossexualidade em uma família que decidiu que ele seria homossexual. Ela o questiona sobre esse garoto da peça enfatizando se ele é 100% heterossexual. Foi possível escutar o desejo de Guillaume, que foi para além do desejo de sua mãe, nos ensinou que é possível não se render ao imperativo desejo do Outro. Após um empenho pessoal Guillaume pode encontrar sua heterossexualidade, consegue diferenciar seus desejos dos desejos da mãe, se identifica com o masculino quando se apaixona por uma mulher. Guillaume entende que amar uma mulher não é deixar de amar sua mãe, mas graças a mãe ele adora as mulheres, aprendeu a observá-las e ouvi-las. O processo de construção da subjetividade ocorre por diversas identificações, assim, os objetos vão sendo trocados. O fracasso ou sucesso nessas trocas será determinante na formação do equilíbrio ou do sintoma e, das possíveis criatividades de cada pessoa. Guillaume reprimiu a heterossexualidade. Se sentia diferenciado por toda sua família, isso refletiu nas suas relações com o mundo externo. O pouco que se afastou dos desejos de sua mãe, começou a perceber seus próprios desejos e criar novas identificações. Conseguiu finalmente fazer as pazes com a sua sexualidade. O fato de existir uma escolha subjetiva sexual tira o sujeito de seu lugar de vítima do desejo de seus pais. Essa é a ética da psicanálise, a qual lida com o sujeito responsável. Por fim, podemos escolher por algo diferente da expectativa do Outro. Em psicanálise, pensamos em sujeitos responsáveis por sua sexualidade, seja ela homo ou heterossexual, que podem escolher por responder tal e qual desejam dele, ou não. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

  • Precisamos Falar Sobre o Kevin: Análise Psicológica

    Há casos que ficam marcados na história por terem em seus contextos, jovens que acabam por assassinar seus colegas de escola e/ou pais ou parentes próximos. A família desses jovens sofrem pressões do meio social que exigem uma resposta, buscando procurar indícios que demonstrem em que momento da construção do sujeito deu-se tal “falha”. Quando tais atos acontecem, surgem os questionamentos: como foi à vida deste garoto? Os pais erraram em algo? Seria algo genético ou adquirido? Conflitos na educação familiar? Ele demonstrava algo que daria indícios para tamanha brutalidade? Perguntas como estas sempre passam pela mente das pessoas. O ambiente familiar é aparentemente normal, uma família de classe média, com nível de conhecimento mediano. Se fosse um problema no pulmão, nos rins, nos olhos - esses pais visitariam os mais diversos hospitais buscando seu devido tratamento. A comunicação é básica e rasa, não há palavras, os pais escolheram não alcançar a real problemática do assunto. Este é um caso de saúde mental e, a família não quer aceitar que o filho saudável, engenhoso e bonito, seja um "doente" mental, por isso, não buscam ajuda, nem falam sobre isso. Os pais de Kevin estão presentes, mas não conseguem suprir as urgências emocionais do filho. Ele é fruto de um desamparo oculto e desesperador. Mesmo que exista a insistência na propensão genética há crueldade e violência, o filme mostra claramente que o ambiente foi incapaz de alimentá-lo de vivências boas. O que fez Kevin tornar-se um assassino em massa? Falha no ambiente? Doença congênita? A psicologia ou a psicanálise poderia auxiliar? Precisamos falar sobre o Kevin é uma adaptação cinematográfica de um romance publicado em 2003 escrito pela americana Lionel Shriver que venceu o prêmio britânico Orange Prize 2005. O filme foi dirigido por Lynne Ramsay conhecida pela competência de abordar situações limites bastante angustiantes. O filme não é relatado de forma cronológica, utiliza-se de flashbacks para remontar a história da família Khatchadourian, composta por Eva (mãe), Franklin (pai), Kevin (16 anos), filho e personagem principal e Celia (6 anos), filha e irmã. É um filme que o espectador desde o começo tem evidencias do desastre final. Eva é uma mulher bem-sucedida no ramo do turismo, independente, casada, que se vê às voltas de uma gestação desejada somente pelo marido. É possível perceber que não há ligação emocional com o bebê de poucos meses de gestação, demonstra aborrecimento e confusa em relação a sua própria barriga, já outras mães estão envolvidas e curtem o momento tão único. Nitidamente apática Eva na cena do parto nos traz um momento muito sofrido e complicado, a reação dela com o bebê é de total desprezo e afastamento. Em seus primeiros meses de vida Kevin demonstra choro intenso, Eva não tem capacidade de acolhe-lo. Demonstra dificuldade em exercer a função materna, percebe-se a sua incapacidade de niná-lo até fazê-lo parar de chorar. O pai, quando segura seu filho, o abraça com muito carinho e ele para de chorar. Tem uma cena um tanto chocante - Eva vai a rua e para o carrinho de bebê ao lado de uma britadeira, onde o barulho estrondoso e insuportável é um consolo que a impossibilita de ouvir o choro inconsolável do seu bebê. Ao longo da infância de Kevin; Eva não consegue se comunicar de forma alguma com seu filho, nem nas mais simples brincadeiras. Há uma cena perturbadora em que a mãe segura o bebê longe de seu corpo chacoalhando-o, e com muito custo se segura para não ceder a raiva de não saber o que fazer. Kevin ao ficar doente passa a ter os cuidados maternos, onde é acariciado e confortado por Eva, que em seguida lê uma história de arco e flecha, uma cena rara e única que trouxe a relação mãe e filho. O pai alheio a situação não percebe o estado de sua mulher e de seu filho, ou prefere ficar alheio. Eva não tem capacidade de acolher as angústias de Kevin. Em seu ato final, Kevin já adolescente, nas vésperas de seu aniversário espera a mãe sair de casa, e de posse do arco e flecha (presente de seu pai) mata seu pai e irmã; em seguida dirige-se a escola, e ao chegar na instituição escolar comete o massacre. A única sobrevivente será a mãe. E então, através do ato (massacre) Kevin tem finalmente o que sempre reivindicou de sua mãe, a atenção. A questão central do filme é que a protagonista não conseguiu elaborar a quantidade de conflitos que surgiam. Durante toda a narrativa do filme Eva está profundamente perdida em suas lembranças a procura de algo que explique sua vivência como mãe. O psicólogo/analista poderia auxiliar Kevin? Será que Kevin poderia ser tratado de sua mente doentia a ponto de barrar o desastre? Ele falaria em uma sessão de análise, colocando para fora toda sua perturbação? Desde a infância, Kevin não aceitava as regras simples e básicas, sua personalidade não foi questionada, seu desregramento é um berro de socorro, não ouvido pelos pais. Vemos claramente, que a criança não é produto de um choque como seria em situação de violência familiar, acidentes graves, abuso sexual, testemunha de um assassinato. Kevin demora para falar e conter os esfíncteres. Ele busca a atenção de Eva com um ar desafiador como se quisesse reivindicar o olhar e o desejo materno. A mãe é sua audiência o tempo todo. A instabilidade do sentimento de Eva é extremamente forte, sem conseguir conter seu ódio pelo filho ela explode e age. Na cena quando Kevin acaricia uma cicatriz em seu braço feita pela mãe ao arremessá-lo com raiva contra uma parede. Kevin sabia que Eva o odiava quando diz que neste momento ela foi sincera no vínculo mãe e filho. Kevin é muito inteligente e incapaz de se expressar, aliás, de forma alguma foi feito algo para impedir que Kevin desencadeasse um desvio. O que mais chama a atenção no filme é a ausência dos pais como guias e educadores, e a total falta de comunicação. Os pais se mostram imprudentes diante dos sinais que Kevin deu. Fingem não ver. O dever real daquele que vai fazer a função materna e/ou paterna é proporcionar perspectivas para seus filhos/as, não esconder o mundo como ele é, clarear a direção por mais sombrio que possa ser a caminhada. É entrar no pensamento mágico da criança, compreender o que se passa nessa mágica, o que ela sente, pensa, se está triste, se algo a angustia. As necessidades dos filhos vai além da fisiológica, dar presentes, boas escolas, viagens, videogames, é também, dialogar muito com eles, dar sua presença, seu tempo, seu amor de modo participativo. Em um processo psicanalítico Kevin talvez pudesse trazer em forma de palavras todo esse vazio afetivo de sua mãe. Colocar toda a raiva e desamparo de que foi vitima desde o inicio de sua vida, e assim, optar por outra forma de defesa para suas aflições imensuráveis que não essa de fazer o seu meio social o palanque da insatisfação - o que garantia o olhar de Eva, a principal testemunha de sua cruel apresentação. O filme é afônico e suplica por socorro e proteção. Partimos de “Precisamos falar sobre o Kevin”, mudamos para “Precisamos falar com o Kevin”, porque Kevin também precisa se comunicar, manifestar sua raiva, seus sentimentos sombrios. E acima de tudo, “Precisamos falar com a Eva”! Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

  • Série You: Um Caso Sobre Stalker, Manipulador e Narcisista

    Série YOU (Você): Original Netflix inspirada no best seller de Caroline Kepnes. A primeira temporada conta a história de Beck, uma candidata a escritora, que vê sua vida mudar completamente ao entrar em uma livraria, onde conhece o charmoso gerente, Joe. Assim que a conhece, Joe tem certeza de que ela é a garota dos seus sonhos, e fará de tudo para conquistá-la — utilizará as redes sociais para descobrir tudo sobre ela. Joe não vai medir esforços para tirar de seu caminho tudo e a todos que podem atrapalhar alcançar seus objetivos. Na série You é possível observar como os afetos de Joe se transformaram em uma fixação muito perigosa. Joe é a figura principal da trama. Parece ser uma história de um rapaz que, visivelmente, tem tudo para ser uma pessoa simples e fácil de se envolver. Ele se mostra carismático, atencioso, charmoso e romântico logo de início, mas também conseguimos perceber algo engenhoso, sombrio e complexo nele. A série se passa a partir da interpretação de Joe e, nos permite entrar na mente confusa do protagonista para enxergar o mundo através de seus olhos. Ele apresenta grande dificuldade de formar vínculos sociais saudáveis. A maior parte de seu tempo é investigar (stalkear) a vida das pessoas que ele diz “amar”. Como o caso de Joe é fictício, a intenção aqui não é de realizar diagnóstico, mas podemos pensar em hipóteses, será que a série You seria um caso sobre stalker, manipulador e narcisista, o protagonista teria traços perversos? O objetivo de Joe é destituir o semelhante da sua condição de sujeito, colocando-o na posição de objeto inanimado. Nessa lógica o perverso se situa de modo precário no registro dos laços sociais, recusando a alteridade e pressionando os limites para produzir angústia no outro. Joe, é o stalker (ato de perseguir) gerente de uma livraria. No momento em que conhece Beck, dá inicio a uma série de pensamentos intrusivos sobre ela, algo que parece fora de seu controle. Na mente de Joe, todas as atitudes e gestos de Beck são voltados a ele, por exemplo, a garota escolheu pagar os livros com o cartão, automaticamente Joe pensou: “Ela usou o cartão de crédito para que eu saiba seu nome”, etc. Através das redes sociais Joe descobre onde Beck mora e quem faz parte do seu meio social, e daí, começa uma incessante perseguição a todos os passos da garota. Beck apresenta muita insegurança na vida profissional e tem momentos altos e baixos com seu atual/ex. Busca experiências limites o tempo todo (uso de álcool e drogas). Parece ser o alvo perfeito para as manipulações de Joe. Sim, as atitudes de Benji (ex/atual) de Beck são péssimas, mas isso não justifica prende-lo em uma jaula de vidro e tortura-lo até a morte. Joe acha que está agindo como um perfeito cavalheiro que salva a moça em perigo e acredita que sua forma de agir o torna herói. Na cabeça de Joe, ela não poderia ficar com um cara que não valesse a pena e tudo que faz é na intenção de defender Beck. Existe outras formas de resolver essa questão, como talvez denunciar o agressor ou oferecer algum tipo de apoio a vitima. Peach (melhor amiga de Beck) assim como Joe tinha obsessão por ela, mas de maneira secreta. Apesar de Joe estar certo com relação a Peach, chega a ser curioso que ele separe suas ações das dela quando na pratica são atitudes bem parecidas. Na verdade, para Joe a amiga era uma concorrente perigosa que tem dinheiro e influência sobre a Beck. Pako, vizinho de Joe, merece atenção. O menino é negligenciado e vive em um lar que não tem estabilidade. Ao presenciar mais um ato violento contra o menino, Joe mata o padrasto do garoto. Pako demonstra alívio e pretende guardar esse segredo. As experiências que Pako viveu não delimitam obrigatoriamente que ele será igual Joe no futuro. Ficam as suposições que a série propõe para a nossa imaginação. No final da série Beck descobre as atrocidades de Joe, e é quando o pensamento surreal de Joe se torna contraditório. Ele a mantém refém na jaula de vidro e a força a escrever um livro. Beck começa a dizer tudo o que qualquer pessoa normal assistindo deve estar pensando. Quando ela quase escapa, ele a assassina. Não podemos esquecer que Joe é stalker, manipulador narcisista e segundo ele foi o amor que não deu certo, e a única coisa que ele assume é ter escolhido a pessoa errada. O óbvio deve ser dito: é evidente que a relação entre Joe e Beck não era amor. Joe criou uma forma deturpada de se relacionar e criar laço social com o outro. Percebam que durante toda a série Joe sempre justifica e culpa suas vítimas, como se elas fossem merecedoras de morrer. O personagem tem atitudes ruins pensando que ajudará na vida daqueles que ele diz amar. Joe vive em conflito com as normas sociais, uma compulsividade de enganar, apático diante dos sentimentos dos outros, desrespeito pela segurança alheia e demonstra sofrimento ao lembrar de sua infância. Nessa temporada, Joe parece que foi “montado” para fazer uma história interessante e criar um personagem com traços patológicos a ponto de provocar certa empatia. Em alguns momentos tive a leve impressão que houve uma romantização desse personagem e, nos pegamos em alguns momentos torcendo por ele. Não fique mal por isso, porque a forte característica de Joe é o charme, a seduçao, o carisma e a manipulação. Assim como os personagens da trama, ele consegue tragar o espectador com suas habilidades estratégicas para alcançar seu objetivo. Joe vai ao extremo para entrar na vida de quem o atrai. É possível acabar caindo na dele sem perceber e os pequenos sinais de alerta podem ser o suficiente para escapar. Do contrário, pode ser tarde demais. Joe chegaria até o consultório do psicólogo/analista? - Provavelmente não!... Já que não reconhece o lugar de suposto saber - ele é quem detém o saber sobre o prazer alheio. Caso aconteça, é para destituir o psicólogo/analista de sua posição, "pervertendo" o setting, seduzindo ou tornando-o voyeur - e cúmplice - de uma "mostração" sem pudores do prazer perverso. Joe não acha que tem algum problema, não considera suas ações transgressoras, ou que esteja fazendo algo de ruim para as pessoas. Já as pessoas que estão ou passam por seu caminho (se sobreviver) são os que sofrem as consequências de seus atos. As outras pessoas para ele são tratadas e vistas como objetos ou coisas sem importância, que devem ser usadas estrategicamente, em prol da satisfação do seu próprio prazer, sem nenhum remorso. Para finalizar - no reino animal, o homem é o único capaz de matar e planejar a morte de outros de sua espécie, movido por retaliação, ambição, conveniência e pela incapacidade de gerenciar as diferenças ou por mero prazer. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

  • Pandemia: Valor Comunitário e as Pílulas da Felicidade na era COVID-19

    Talvez amadurecemos com o passar dos (d)anos. Aderir ao isolamento no início era uma forma de respeito as pessoas que estão no grupo de risco e dever enquanto cidadãos morais e éticos. Pensar coletivo naquela situação em que nos deparamos foi essencial. O período de quarentena desencadeou um estado significativo de estresse. Aos caseiros e introspectivos talvez aquele momento de isolamento não era um desafio tão difícil. De repente, por força maior tivemos que nos adaptar a situação de pandemia: adiamos nossos planos, ficamos confinados, sem rotina, reduzimos as atividades bruscamente. Diante do desconhecido (vírus) surgiram angustias, sentimento de incerteza, de solidão e tédio. Recebemos orientações para agir dentro das medidas cabíveis de higiene e prevenção. Alguns entraram em desespero, porque não sabíamos o que estava por vir. Que sejamos conscientes, talvez essa crise vem acompanhada de uma oportunidade de revolução. Frente essa pandemia podemos repensar nossos modelos econômicos. Quantos microempreendedores foram prejudicados na quarentena? Quantos subempregos ficaram desassegurados durante essa crise? Retomamos ao lar de maneira forçada, tiramos o pé do acelerador e tentamos nos reinventar: ler livros, assistir filmes e séries que estavam acumulados, carinho nos bichinhos etc. O senso comunitário era uma das propostas no inicio da pandemia, então, chegamos a um ano de crise e confusão marcado pelo coronavírus (Covid-19). Uma crise na saúde, na economia, sobretudo, uma crise humanitária. Para grande parte das pessoas o isolamento não está sendo nada cômodo. As consequências psicológicas em função da Covid-19 são diversas. Muitas pessoas que antes não eram ansiosas, agora estão sofrendo com ansiedade. Há pessoas cujos efeitos da quarentena intensificou as fragilidades que já estavam presentes antes. Além disso, o sentimento de confusão, reações agressivas ou irritadas e desorientação estão sendo comuns. A atualidade moderna da medicalização nos coloca em um beco sem saída quando pensamos na existência humana, o corpo biológico não é o único a se manifestar, agora, o corpo psíquico denuncia o inconsciente, trazendo sintomas psicossomáticos (processo de subjetivação que acessa a sua realização na via corporal). De alguma forma enraizou-se que para toda doença (teoricamente) teria assim um remédio, de modo a silenciar. Durante a pandemia e as ofertas das pílulas da felicidade na era covid se intensificou, então, age-se de forma inconsequente em relação as próprias emoções, visto que a causa de todos os afetos tem que ser sentidos, e nunca “curados”. Em outras palavras, é quando se acredita em uma alegria plena acabamos nos esbarrando em propagandas do qual o viver as vezes aparenta difícil e para facilitar, cabe então as pílulas. Viver não é sinônimo de juras de felicidade, mas sim se responsabilizar-se por articular, elaborar e identificar o próprio mal-estar. Na era Covid-19, há um imenso desejo por um remédio para a prevenção ou a cura da doença do corona e de suas consequências emocionais, no entanto, não existe remédio para O VIVER, sendo assim, é de grande urgência desconstruir que todo problema se caracteriza como enfermidade. A tranquilidade e o silêncio causado por pílulas podem ser mais perturbadores do que a própria passagem pela tempestade. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

  • Psicopatia do Cotidiano: Quem são os Psicopatas que não matam?

    Os assassinos em série que aparecem em telejornais ou personagens de filmes de terror chamam a nossa atenção por conta de suas atitudes cruéis. Mas, o que a maior parte da sociedade não sabe é que, antes dos casos mais graves de psicopatia, existe também um tipo de psicopata que pode até não praticar crimes absurdos, mas causa danos irreparáveis aos que estão a sua volta. O que é a psicopatia do cotidiano e quem são os psicopatas que não matam? É possível encontrá-los em nosso ambiente de trabalho, escolar, vizinhança e, até mesmo em nossa própria família. Por exemplo: é o patrão que desclassifica o funcionário na frente de todos; é o vizinho que sempre procura gerar confusão no condomínio; é o namorado que sufoca demais; é os pais que fazem chantagem emocional com frequência para que os filhos tomem atitudes inversas as suas vontades. A psicopatia ou as manifestações de atos psicopáticos estão presentes na sociedade, na medida em que se apresentam em diversas instituições e meios. Para ilustrar a psicopatia do cotidiano separei alguns acontecimentos que vemos diariamente nos noticiários. Sobre o meio familiar: não é incomum pai/mãe matando filho e vice-versa. Os filhos são altamente protegidos, e se fala a eles somente o que eles querem ouvir; os pais precipitam-se aos seus desejos, não deixam que nada falte aos filhos. Gravíssimo delito dessa nova geração. Quando frustrados, se são crianças, fazem pirraça, se jogam no chão, esperneiam, gritam e no exato momento conseguem tudo o que querem, especialmente se estão em público, por saberem como causar mal-estar nos pais. Reparem, pois, os filhos dos tempos atuais, são esvaziados de desejos e planos. Não sabem o que almejar para o futuro, não querem pensar, não sabem o que vão fazer amanhã. Estão o tempo todo insatisfeitos, se dizem tristes e que ninguém os compreendem. De forma muito precoce aprendem como manobrar os adultos, principalmente os que se sentem mal por terem uma agenda lotada de tarefas e pouca atenção aos filhos, com a ausência dos pais crescem cobertos de presentes. Na fase adulta, não querem se frustrar com nada e frente as diferenças se mostram intolerantes; utilizam recursos ilegais para conseguir o que desejam e, as vezes de forma cruel. Recorrem a mentiras, atrocidades, trapaças. Talvez, os pais e professores poderiam ser melhor instrumentados para entender, ainda nas crianças e adolescentes, indícios de transtorno de conduta: maldade e frieza emocional seguido de falta de culpa, fraudes, mentiras, vandalismo, enfrentar pais e professores, repassar as responsabilidades, uso precoce de drogas e álcool. Sobre o meio religioso: chamo a atenção para os casos de abuso sexual, pedofilia e corrupção que são alguns dos crimes dos quais líderes espirituais e religiosos são acusados, vistos como “pessoas sagradas”, porém, teriam se aproveitado da fé alheia. A pouco tempo o médium conhecido como João de Deus – acusado de centenas de abusos sexuais a mulheres que buscavam atendimento, no centro espírita mantido por ele. Já a Igreja Católica também teve o nome manchado por omissão e até conivência com padres pedófilos. Isso ocorre por décadas e os relatos passam de mais de 1 mil crianças que teriam sido vitimas de pedofilia. Segundo o relatório da Suprema Corte estadunidense, os atos aconteciam enquanto líderes religiosos acobertavam os abusos, que por sua vez, passam o dia falando no amor e temor às leis de Deus. São fingidos e dissimulados. Sobre a tribo política em Brasilia: Parece que se esgotou a reserva ética e moral, definitivamente não há. Restou pouquíssimo ou quase nada. Habitamos um hemisfério competitivamente primitivo e sem lei, em especial, aos que estão no poder e manuseiam as regras conforme seus próprios interesses. Maior exemplo é na falta de constrangimento, culpa ou remorso dessa tribo política que vemos com frequência nos noticiários. Governantes abordam com naturalidade desvios de verbas públicas, mensalões, caixa dois, flagras de dinheiro nas cuecas e meias, sonegação e corrupção. Ao seguir relembrando alguns fatos esquecidos e outros recentes: há onze anos, na época era futura candidata ao cargo de presidente da república fraudou seu curriculum lattes, dizendo que era mestre e doutora sem ser uma coisa ou outra. Falsificar Curriculum Lattes equivale, na Academia, a usar um falso diploma de médico. Como bons psicopatas, os políticos têm o dom para reinterpretar as leis de forma que os beneficiem, ou de reinventá-las, deturpar as regras e, ao mesmo tempo, são colaborativos em organizações de combate à corrupção levantando a ética como bandeira. Sem generalizar, porque nem todos os políticos são psicopatas, mas não existe dúvida de que psicopatas adoram o poder e por isso se interessam bastante pela política. Sobre a pandemia da COVID-19: Em março de 2020 a vida dos brasileiros virou de cabeça para baixo quando veio a preocupação com a covid-19. Diante de uma catástrofe mundial podemos visivelmente perceber o despreparo e desunião da gestão do país. O atual presidente lançou um “e daí”, “não sou coveiro” como posicionamento em meio a tantas mortes pelo coronavírus. Não, não é nada coerente e tão pouco engraçado, é de uma frieza absurda e desdém frente ao sofrimento alheio. Lastimável. Importante pontuar que apesar de o conceito de psicopatia vir do grego (psyche - “mente”, e pathos - “doença”), não é considerada uma doença mental. Pois os psicopatas têm total noção da realidade e não apresentam nenhum delírio ou alucinação, isto é, são seres racionais e conscientes de seus próprios atos e comportamentos. Eles sabem distinguir as varias nuances da realidade, sabem o que é bom e ruim, ou o que é certo e o que é errado, sabem identificar a lei e, se a infringem, é pelo simples prazer de fazê-lo. Sobre o meio corporativo: os psicopatas se instalam com sucesso nas empresas. Eles têm os requisitos almejados pelos lideres empresariais, como inteligência, capacidade analítica e de liderança, ambição, disposição para encarar os problemas e carisma, até aqui tudo bem, porém, há empresas que usam esses atributos de forma errônea e consciente - não respeitam sócios, clientes nem funcionários. São organizações que trapaceiam seus resultados para vender melhor as suas ações na bolsa. Um acontecimento que marcou a Páscoa de 2004, em que marcas famosas de chocolate Lacta e Garoto "maquiou" a quantidade de chocolate por embalagem. O problema, segundo a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, é que a diminuição ocorreu sem informar os consumidores, assim, lucraram bastante com estas manobras. Necessitamos, com urgência, rever conceitos básicos que foram perdidos: ética, tolerância e empatia; eles farão a diferença na nossa capacidade de conhecer o mundo atual que traz como marca a psicopatia do cotidiano. Outro marco interessante foi com o banco Itaú que demitiu 50 funcionários que solicitaram de forma indevida o auxílio emergencial, pago pelo governo federal durante a pandemia do novo coronavírus. Os trabalhadores não atendiam aos critérios de elegibilidade para receber o benefício. De acordo com as regras do programa, pessoas com emprego formal não fazem parte do público-alvo. O banco denominou as atitudes dos funcionários como desvio de conduta. Essa atitude da empresa talvez tende a diminuir a frequência dessas ações, por conta de tornar o espaço limitado para quem mostra esse tipo de comportamento. As pessoas que estão ou passaram pelo caminho do psicopata são os que sofrem as consequências de seus atos, porque são tratadas e vistas como objetos ou coisas sem importância, que devem ser usadas impulsivamente em prol da satisfação do próprio prazer, sem nenhum remorso. Exemplo disso é do golpista Vagner Camargo que tirava dinheiro de idosos para ostentar vida de luxo, agia no autoatendimento dos bancos oferecendo “ajuda”. Aplicava o golpe bancário em idosos, gastando todo o dinheiro roubado com carros, imóveis e viagens caríssimas. Myrian de Souza é outra golpista descarada, mantinha um falso cartório no Rio de Janeiro. Ela realizava desde 2013 cerimônias religiosas de casamento no local e entregava certidões falsas aos noivos. O falso cartório cobrava R$ 600 reais pela cerimônia religiosa. A sociedade atual apresenta funcionamento psicopático na medida em que misturam eventos que banalizam o mal e a morte, anestesiando a moral, no qual o sistema mercantil capitalista possui grande poder sobre a vida dos indivíduos e opera sobre uma lógica de supervalorização de riquezas, colocando em prejuízo os sentimentos e formando uma cultura individualista. A pouco tempo tivemos um caso de abuso de poder sobre a soldado Jéssica Paulo do Nascimento, de 28 anos, que denunciou um tenente-coronel por assédio sexual e ameaças de morte, ela decidiu deixar a carreira na Polícia Militar e foi exonerada. Ela tomou a decisão após sofrer pressão dentro da corporação devido à repercussão do caso. Na policia, talvez seja um meio favorável para os psicopatas ingressarem, porque não existe um modo de barrar que eles ingressem nessa instituição, que é muito atrativo, por lhes conceder legitimidade e autoridade para seus atos. Sobre as redes sociais: vivemos a modernidade e os psicopatas do cotidiano também se atualizam criando novos golpes através das redes sociais. Instagram é uma das redes mais usadas pelos golpistas para aplicar fraudes em vendas on-line. Com anúncios falsos, perfis vendem produtos que nunca são entregues ou que não condizem com o que é anunciado. Alguns utilizam nomes de marcas famosas para ter mais credibilidade. Atualmente fala-se bastante sobre bullying (assédio moral) modalidade de assédio caracterizada por agressões intencionais, verbais ou físicas, feitas de maneira repetitiva, promovida entre escolares, crianças e adolescentes. Abala as vitimas, causando sinais de ansiedade, depressão, angustia, medo e constrangimentos, marcas que ficam no corpo e na alma. Nessa nova era, em ‘um estalar de cliques’ temos informações do mundo em tempo real. Os agressores também estão on-line: cyberbullyning. Mais de trinta milhões de jovens brasileiros possuem uma relação intensa com a internet, aplicativos de relacionamentos, Facebook, Instagram, WhatsApp, Twitter, Youtube etc., os agressores criam grupos ou falsos perfis com a intenção de difamar e ofender, arruina uma imagem e uma identidade ainda em construção. É a tortura cibernética. Ainda sobre os meios de comunicação tais como: Jornais, Revistas, Filmes, Programas, séries de TV e Histórias em Quadrinhos são amplamente consumidos pela população e, com mais frequência que se deseja ou é esperado, muitas vezes usado como formas de conhecimento e aprendizagem. As informações e ideias obtidas nestes materiais acabam gerando opiniões em torno dos personagens que perduram como informação válida para gerar ideologia. A falta de tempo e dia cansativo ligados ao hábito de não ler regularmente, faz com que as pessoas consumam este tipo de material não apenas como entretenimento, mas também como fonte de informação, formação de opinião, de conhecer aspectos da realidade e instrução geral. Observo que prevalece uma imagem deturpada da psicopatia (sinônimo de serial killer), em grande parte, gerada pela mídia. O psicopata não é apenas aquele sujeito que mata com prazer ou que comete crimes absurdos como podemos identificar ao longo desse artigo. A maioria do nosso meio social não vê isso, provavelmente por basear-se nos noticiários, cinema ou redes sociais, acabamos vinculando o psicopata somente a pessoas com uma aparência insana, violenta e que, assim, são mais fáceis de identificar. Há elementos comuns característicos em um psicopata – um marcado egocentrismo, profundo desprezo pelos sentimentos e pelas necessidades alheia. Eles fazem parte de nossa rotina, e são difíceis de identificar, já que a nossa atenção está voltada à mídia, que apenas divulga casos extremos de serial killers. Exemplos é o que não faltam: O mais atual foi há alguns meses, Lázaro tem um histórico longo de crimes: assassinatos, estupros, sequestros, roubos etc., além disso, durante sua fuga contava com ajuda de fazendeiros (cúmplices) - que a pouco recebeu beneficio de responder em liberdade. Em 2007, foi preso na Bahia em sua cidade natal, Barra do Mendes, por um duplo homicídio, porém, fugiu para Brasília. Mesmo com laudo psicológico “psicopata imprevisível”, Lázaro em 2013 teve um benefício concedido por bom comportamento para o regime semiaberto. Ele foi liberado e voltou a cometer os mesmos crimes. Foi capturado em junho de 2021 e morreu após uma troca de tiros com policiais. Deve-se levar a sério a realização de exames criminológicos com avaliação ampla da capacidade para convivência social, antes da soltura de presos que apresentem distúrbios de comportamento, evitando riscos para a segurança da sociedade. Sem endurecer as leis, a violência cresce a cada dia e torna-se uma agressão ao bom-senso dos cidadãos do bem. Alguns psicopatas dizem de forma aberta, impudica e provocativa: “se me soltar, volto a estuprar, volto a matar”. Cruel, portanto, é a lei que quer tratar os diferentes de forma igual aos demais e deixa o meio social vulnerável. É inadmissível se esconder em bordões: “violência é da natureza dos seres humanos” e nos entregar a sua maldade. Tratar a violência como algo banal é, de alguma forma, preservá-la atuante, dissolvendo simbolicamente seus efeitos não levando em consideração suas manifestações. Sobre psicopatia e uma possível “cura” : sabemos que não há, mas e se houvesse um olhar mais atento, talvez sendo otimista, impossibilitando um quadro mais grave de psicopatia na vida adulta. E claro, os psicopatas nem sempre são fáceis de detectar, depende do nível de psicopatia, se baixa, moderada ou grave. Frequentemente, convive-se com psicopatas porque nem todos viram assassinos, têm uma vida supostamente normal, praticando seu poder de sedução, levando vantagens e debilitando os mais frágeis, traindo, manipulando, em relacionamentos predatórios com quem passam pelo caminho e que podem ser presas fáceis do seu prazer perverso. Ainda sobre um possível tratamento da psicopatia há dualidade nos achados científicos. Sendo que para os psicopatas atualmente não existem tratamentos terápicos eficiente, este público possui grande negação e resistência por conta do egocentrismo, dificultando um bom resultado em algum tipo de intervenção. Por outro lado, existem pesquisas no meio cientifico que certificam um bom retorno ao tratamento de psicopatas, nestes estudos foram apontados fatores que constatam o fracasso terapêutico, tais como: a pessoa não aceitar o tratamento e sem evolução do mesmo; crime antigo cometido pelo psicopata onde a vitima não fazia parte do convívio dele; antecedentes prisionais. Para que a terapia funcione no psicopata é importante sublinhar que ele precisa reconhecer em si mesmo que há problemas e que isso precisa ser tratado de forma diferente da estrutura neurótica - que não é o foco desse artigo. Dado que o sujeito psicopata acredita ser soberano, e o que ele faz pode ser por ele entendido como um bem para o meio social - aqui temos uma encrenca. Em psicanalise, uma personalidade psicopática é definida como um sujeito que vive em conflito com as normas sociais, uma compulsividade de enganar, apático diante dos sentimentos dos outros, desrespeito pela segurança alheia e ausência de culpa. Portanto, a psicanálise não é capaz de mudar a natureza humana, mas talvez possa mostrar possibilidades para essas inclinações pouco nobres. Aqui não se trata de psicanálise clínica, há perversões e perversões, e temos de levar em conta essa psicopatia do cotidiano (perversão comum) e identificar que ela diz respeito em graus diferentes a qualquer pessoa. O tratamento para a psicopatia, se é que tenha, é de ordem social e, portanto, não é terapêutico e, sim, educativo. Os psicólogos e psicanalistas não possuem uma saída ou fórmula mágica. No momento em que a sociedade procura novos valores, a psicanálise possa contribuir com orientações por ser capaz de elucidar a subjetividade e o não-todo-racional que formam o sujeito. O mais ruim, contudo, é que estamos adormecidos frente essas noticias e cenas violentas - assistimos a elas algumas vezes sem nenhum tipo de esboço, sem indignação, sem afeto. E com a ausência dessas características, com o tempo, podemos debilitar a capacidade reflexiva. Fica a questão: será que um dia resgataremos a nossa capacidade de nos revoltarmos ou voltarmos a nos equipar de maneira apropriada para estas atitudes? No reino animal, o ser humano é o único capaz de planejar a morte de seu semelhante, movido por vingança, ganancia, interesse, falta de capacidade de administrar as diferenças ou por puro prazer. A vida e a violência foram banalizadas. A crueldade sapateia sob nossos olhos repetidamente e se disfarça de varias maneiras, de sorte que para os que tomam consciência dela, quer nos noticiários, quer como testemunhas oculares, é aceita como algo natural do dia a dia e seus efeitos são inofensivos. Porém ela é destruidora para quem é vitima, a ponto de o sujeito, em certas situações, não mais se ajustar, e desaparecer, falecer. Claro que qualquer ser humano pode agir de modo ruim, dependendo da situação. Qualquer um de nós em algum momento da vida pode ser egoísta, manipulador, hostil, agressivo, invejoso, malvado, descontrolado etc., a questão é quando essas características se tornam rotina, inflexíveis e repetitivas em diferentes momentos, ao ponto de sofrer e sentir perturbações a si próprio e, acima de tudo, aos outros. Finalizo, mas com um alerta, a psicopatia do cotidiano está aí, está aqui, a nossa volta, é imperceptível e passa-se a viver com ela. Psicóloga Renata Gonçalves – CRP 06/122453

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